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e lá atrás, antes de se tornar amarga em razão das asperezas que a vida lhe trouxe, ela gostava de sentar-se à beira da calçada pra procurar as pedras brilhantes no meio dos paralelepípedos da rua.
achava poucas, é verdade, mas as colhia e colocava naquele pote grande de maionese que uma vez ganhara da mãe, com um laço e a pintura de um coração em seu vidro. dizia que um dia encheria até a metade o pote com as minúsculas pedrinhas, e então colocaria água de nascente e um peixe dourado, que chamaria-se Jasmim.
e assim seus dias seguiam-se, a menina na calçada e a procura das pedrinhas que eram difíceis de encontrar. mal chegara aos 3 dedos do pote quando começaram as chuvas.
e nessa época, não era bom que as crianças brincassem na rua, nem nos estios, calçadas de galochas. e nesse ponto, sua mãe, embora ausente na maior parte da vida, era rigosa. não podia sair.
ao fim das chuvas, o progresso se mostrara.
não havia mais paralelepípedos. a rua agora era de asfalto. liso, seco e cinza. não havia cor, e nem sinais de pedrinhas brilhantes, porque essas se escondiam nos vãos dos paralelépidos.
assim, o fim das chuvas foi também o fim da caçada, e a menina não mais se sentou na calçada da rua, e nem mais teve seu peixe Jasmim.
a chuva não lavou só a simplicidade daquele lugar, deixando o caminho limpo pro progresso cinza.
a chuva lavou também os sonhos da menina.
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