domingo, 27 de maio de 2012

# 284


::

sou absolutamente contra o coitadismo.

todo coitadinho, antes de ser coitado, fez alguma merda bem grande, sacaneou alguém, maltratou, deitou e rolou.

só que quando o jogo vira, é mais fácil se acoitadar do que reconhecer os erros e pedir desculpas. claro, a vítima é sempre a mais cuidada, a mais socorrida.

sou completamente anti coitadismo.
detesto me fazer de vítima, que vejam como o vilão mesmo.
nunca posei de santo, de bonzinho.

sou só humano, que é bom e mau, na mesma proporção.
mas entre o vilão e o coitadinho, prefiro o papel do vilão.
afinal, quando a novela termina a gente se lembra é de quem? da nazaré, da laura ou daquela outra, tadinha, que já nem lembro o nome?

#283

::


então é assim.
eu gosto, me entrego, mergulho de cabeça mesmo, sem medo de ser quem sou, sem medo de querer ser feliz.
e, na maior parte das vezes, me encanto com um esboço, com uma vontade alheia de ser quem não é, de um papel bem desempenhado de um personagem.
papel esse que dentro de alguns meses não consegue mais ser mantido.

daí, passam a aparecer as prioridades unilaterais, por parte de mim, que não fui personagem e que só queria viver aquele encontro, aquele conto. passa a parecer que só eu tinha vontade de encontrar, de ver, que a saudade era só de mim.

com o tempo, o esforço que se faz só de um fica fraco, que se cansa, e a tendência do outro, já acomodado, e certo de que não seria solto daquela relação, era de que a coisa permanecesse daquele jeito.
só que não é bem assim.
paciência, uma hora, se esgota. submissão também. e aquele que é submetido à toda essa romaria de vontade alheia, se cansa e grita seu "chega".

daí a vida se abre, e aquele que outrora fazia pouco caso, desprezava, agora entende que o outro lhe era sim importante.
mas esse outro já se cansara de amores tardios. do perder pra valorizar. não mais lhe cabia.
daí, seguia sua vida, assobiando uma canção que dizia que um dia havia de encontrar alguém que lhe valorizasse desde o começo, que não precisasse de um susto, de uma perda, pra perceber o seu valor e sua singularidade perante o mundo.

e, num cantar baixinho repetia "ninguém vai me dizer o que sentir".

# 282

::

e quando eu começo a gostar de alguém, eu não tento, de forma alguma, parecer ser quem não sou.
já fazem quase três ano e meio de terapia pra entender que gosto de mim do jeitinho exato que sou.
daí, me apresento, assim, cheio dos defeitos e qualidades que a vida me moldou. feliz, satisfeito, eu.

e de modo linear, sigo naquele relacionamento, às vezes me adaptando àquele ou àquele outro particular, desde que não exija que eu fuja muito da minha essência, paciência para isso me transborda.

o que não aceito é o abuso. abuso do respeito, da paciência, da adaptação.
abuso daquilo que é liberado pelo bem do casal.
abuso unilateral do direito de dizer não. de não querer ou poder se adaptar de acordo com a agenda do outro.
não aceito ter que me submeter, que regular a minha vida de acordo com a vontade de outrem.

 em 30 anos de existência, a vida insistiu em me mostrar que não é na base do grito, da chantagem, do apelo, que a gente consegue ficar junto de alguém. é na base da cumplicidade, que nunca, jamais, pode ser unilateral.

é comum pra mim, já no decorrer de tantas relações, de ter a importância reconhecida só a partir do momento em que se finda a relação. isso já ocorreu várias vezes, na maioria delas, aliás.

o que ficou pra mim é a certeza de que mergulhar num relacionamento, me entregar e viver tudo aquilo que me aparece à frente é legítimo. que eu devo permanecer nessa jornada, nesse entregar. por isso, não me arrependo de nada do que vivi.

só fico triste de saber que esse valor todo, essa entrega, só é reconhecida após muito abuso, muito desafio, muito cansar do meu bem querer. só é reconhecido quando a pedra já não me parece tão preciosa assim.

é difícil nesse mundo de acomodamentos, que a gente se dê conta e valorize o sentimento alheio, que a gente perceba que já é feliz. a gente quer sempre mais. e nessa busca pelo mais, a gente deixa pra trás, talvez, o que tenha sido de mais real no campo sentimental na nossa vida.

o que ocorre é que esperar cansa. que ter que ver perder pra ganhar cansa. e que ter reconhecido o que se é, depois de muita luta, cansa.

o recado que fica é, que abramos os olhos pra o que nos exalta, que brilha, e deixemos as coisas com que se preocupar com o tempo. o que importa é ser feliz, agora, nesse momento.


sábado, 5 de maio de 2012

# 281

::


ele nunca quis ser uma pessoa óbvia.
mas, é óbvio, que nem sempre é possível driblar a obviedade.
sim, porque de vez em quando o único caminho da vida é seguir aquele roteiro mesmo, que todo mundo segue.
claro que durante a caminhada é possível fazer pequenas adaptações, pra poder fugir do clichê, mas sair do resultado final, ah, aí não dá.

e era assim em todos os aspectos de sua vida.
quando escolheu sua profissão, quis ir na contramão de todo o seu histórico familiar, e virou o primeiro da família a fazer direito.
comeu o pão que o diabo amassou no começo, mas depois de algum tempo de trabalho deu-se por satisfeito.
não seguiu o roteiro como manda o figurino. ia pra faculdade de all star todos os dias, e só comprou o seu primeiro terno pra ir ao baile de formatura.

na vida familiar a mesma coisa. enquanto seus primos e parentes da mesma faixa etária moravam com os pais, dentro do conforto de não ter que pagar contas de moradia, ele não, resolveu que ia sair de casa cedo, aos vinte e poucos anos, e lá foi-se, se desdobrando pra pagar as contas, mas bem feliz no seu cantinho. 
e desde sempre viveu em casa, com passarinho, cachorro e planta. mas quando deixou a casa dos pais, resolveu que viveria em um apartamento. 
com horário de fazer barulho, vizinho de porta e tudo o que tinha direito.
na contramão de ter um quintal.

quanto à vida amorosa, outra fuga do lugar comum. 
não gostava de se imaginar repetindo um comportamento do namorado anterior de alguém. 
por isso nunca gostou de dar buquês de flores.
quando muito, dava uma planta no vaso, que era pra ser cuidada e durar mais.

e mais, vivia tentando fugir dos clichês. 
mas como um apaixonado foge de clichês? não tem jeito!
às vezes tem que seguir sim o roteiro.
mas ele é um cara de improvisações, e por isso, tenta, de todo modo, fazer aquele ou outro acréscimo dentro do texto já pronto.

é, às vezes é impossível fugir das obviedades, mas sempre é possível deixar seu diferencial.